22 MAR 2020 - O bispo Dom Celso Antônio divulgou neste domingo (22) uma carta a todo o povo de Deus presente na Diocese de São José dos Pinhais, e convida os cristãos a serem testemunhas de esperança. 

 

 

São José dos Pinhais, 22 de março de 2020.

Ao Povo de Deus presente na Diocese de São José dos Pinhais

Em virtude da pandemia de COVID-19, todos vivenciamos um período marcado por desafios sanitários, sociais, econômicos e religiosos. O Brasil e toda a comunidade internacional tem sofrido o impacto das consequências de tal pandemia, e muitas destas incidirão em nossa vida a médio e longo prazo. Acompanhamos dolorosamente os irmãos e irmãs que estão enfermos ou cujos familiares estão nessa condição. Somos solidários e próximos das famílias que perderam seus entes queridos. Estamos em comunhão com as autoridades públicas e todos os profissionais de saúde que tem trabalhado no combate à pandemia. Além disso, a maioria de nós tem feito a experiência do isolamento social ou quarentena, pois se trata da principal medida inibidora da transmissão do novo coronavírus. Sabemos que toda adaptação a uma situação nova como essa pode desencadear um processo estressante. Os cristãos, no entanto, imersos nesse contexto, são chamados a ser testemunhas de esperança. Mas de quê esperança estamos falando?

São Paulo, na Carta aos Romanos, afirma que é “na esperança que fomos salvos” (Rm 8,24). O Papa Bento XVI, na Carta Encíclica Spe Salvi, reitera-nos que é pela esperança que “podemos enfrentar o nosso tempo presente: o presente, ainda que custoso, pode ser vivido e aceite, se levar a uma meta e se pudermos estar seguros desta meta, se esta meta for tão grande que justifique a canseira do caminho” (Spe Salvi 1). De fato, a situação presente nos tem custado e cansado! Porém, os cristãos, pela esperança, caminham rumo à meta, que não é outra senão a Pessoa de Jesus Cristo! O mesmo Bento XVI explica: a esperança “é espera das coisas futuras a partir de um dom já presente. É espera – na presença de Cristo, isto é, com Cristo presente [...]” (Spe Salvi 9). Mesmo em meio ao sofrimento, à tribulação, ao medo e ao isolamento nós já experimentamos, pela fé, aquilo que virá: a alegria, a bonança, a serenidade, a paz! A esperança cristã não é, então, uma simples expectativa de que as coisas vão melhorar. Nossa esperança é a certeza de que o Senhor Jesus, que nunca nos abandona, já nos fez “mais que vencedores” (Rm 8,37), e misteriosamente nós já experimentamos hoje o que contemplaremos após o atual período, pois se a morte não teve domínio sobre Jesus (cf. Rm 6,9), nenhuma situação de morte ou sofrimento terá a última palavra sobre a humanidade.

“Quem nos separará do amor de Cristo? Tribulação, angústia, perseguição, fome, nudez, perigo, espada? [...] nem a morte, nem a vida [...] nem o presente, nem o futuro [...] serás capaz de nos separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8,35.38-39).

Todavia, a esperança cristã se expressa de maneira prática, mediante comportamentos e práticas inscritas na Escritura e na Tradição viva da Igreja.

1) Oração. A esperança dos cristãos é uma esperança orante. “Ele [Jesus], porém, se retirava para lugares desertos, e orava” (Lc 5,16). O tempo quaresmal nos motiva a intensificar nossa vida de oração, que deve marcar este período de isolamento social. Rezemos por nós, por nossas famílias, pela Igreja, pelos irmãos e irmãs impactados por essa pandemia, por toda a comunidade humana. Nossa oração nesse tempo deve ser especialmente intercessória: “interceder, pedir em favor de outro [...] é próprio de um coração que está em consonância com a misericórdia de Deus” (Catecismo da Igreja 2634). A recitação do Rosário é prática indispensável, pois contemplando com Nossa Senhora os mistério da vida de Jesus reclamamos dele as graças necessárias a nós e a todos nesse tempo de provação.

2) Leitura Orante. A esperança dos cristãos está fundada na Palavra. “Ora, a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5). A chamada Lectio Divina acompanha-nos sempre como meio privilegiado de nossa relação com Deus. É na leitura orante da Palavra de Deus que firmaremos ainda mais nosso coração na certeza de que o Senhor ama e cuida de todos. É na leitura orante que alimentamos nossa fé e é a partir dela que podemos consolar os nossos irmãos e irmãs. É na leitura orante que encontramos a serenidade cristã diante da dificuldade: “O Senhor é meu pastor, nada me falta [...] [Ele] reconforta a minha alma” (Sl 23,2-3).

3) Fraternidade. Diante da impossibilidade de nos reunirmos presencialmente para celebrar o mistério da nossa fé – a Eucaristia – por motivos sanitários, somos convidados a fazer comunidade utilizando-nos dos meios de comunicação e das diversas mídias disponíveis. Acompanhemos a Missa diariamente transmitida por estes meios, unindo-nos à oração da Igreja mediante o ofício do padre que celebra não sozinho, mas com toda a Igreja que é o Povo de Deus, Corpo de Cristo: “se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele” (1Cor 12,26). O Papa Francisco nos motiva a isso e nos conclama à nossa comunhão espiritual, recitando a seguinte oração:

Aos vossos pés, ó meu Jesus, me prostro e vos ofereço o arrependimento do meu coração contrito que mergulha no vosso e na Vossa santa presença. Eu vos adoro no Sacramento do vosso amor, desejo receber-vos na pobre morada que meu coração vos oferece. À espera da felicidade da comunhão sacramental, quero possuir-vos em Espírito. Vinde a mim, ó meu Jesus, que eu venha a vós. Que o vosso amor possa inflamar todo o meu ser, para a vida e para a morte. Creio em vós, espero em vós. Eu vos amo. Assim seja.

4) Comunhão em família. Nosso isolamento – inclusive daqueles que estão acometidos pela COVID-19 em suas residências ou nos hospitais – não é isolamento absoluto, pois todos temos uma família. Permaneçamos com os nossos, permaneçamos em comunhão, estreitemos nossos laços, estejamos concordes com os de nossa casa e com todos que conhecemos e não conhecemos. A meta final da esperança cristã é a comunhão plena com Deus na eternidade. Que a nossa meta neste tempo seja a de gerar comunhão e unidade entre nós e com todos! Nós somos família de Deus (cf. Ef 2,19): que a nossa família seja expressão do amor e da misericórdia de Deus em tempos tão difíceis!

Por fim, nossa esperança é graça de sabedoria. Saibamos, com a graça de Deus, viver o hoje, resguardando-nos conforme as orientações dispostas pelas autoridades e crendo na Palavra que nos orienta: “[Filho], mantém o teu coração firme e sê constante [...] Crê em Deus, e ele cuidará de ti; espera nele, e dirigirá os teus caminhos” (Eclo 2,2.6).

A Mãe de Jesus, Nossa Senhora, é Mãe da Igreja! Ela não nos deixará faltar o auxílio do seu Filho! Ela é a Mãe das Dores, a Auxiliadora, a Mãe da Esperança, a Senhora das Graças, a Mãe do Perpétuo Socorro, a Mãe da Saúde; enfim, a nossa Mãe, que nos ampara na tribulação! Rezemos juntos:

À vossa proteção recorremos, Santa Mãe de Deus. Não desprezeis as nossas súplicas em nossas necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos, ó virgem gloriosa e bendita. Amém.

 

Dom Celso Antônio Marchiori
Bispo Diocesano de São José dos Pinhais